Nos últimos anos, as redes sociais tornaram-se o principal palco para o surgimento e desenvolvimento de novas subculturas urbanas. Plataformas como TikTok, Instagram, Discord e Reddit não só facilitaram a comunicação entre pessoas com interesses em comum, como também permitiram que identidades culturais alternativas ganhassem visibilidade global.
A migração do espaço físico para o digital
Antes, as subculturas floresciam em espaços urbanos concretos — clubes, ruas, bairros, comunidades locais. Hoje, essa dinâmica expandiu-se para o mundo digital. A internet permitiu o encontro e a troca de ideias entre jovens de diferentes realidades, ultrapassando fronteiras geográficas e sociais. O resultado foi uma diversificação imensa de estilos, discursos e microcomunidades.
Estéticas e estilos emergentes

Subculturas como o dark academia, que valoriza a melancolia, o saber clássico e a estética inspirada em universidades antigas; o cottagecore, centrado na vida simples e bucólica; ou ainda os estilos e-girl/e-boy, marcados por influências do anime, da música alternativa e do gaming, são exemplos de movimentos que ganharam forma quase exclusivamente online. Estas comunidades partilham gostos, códigos visuais e referências culturais, formando novos imaginários colectivos.
Outros movimentos como o goblincore (focado na valorização do feio, do sujo, do natural não domesticado), ou o femboy aesthetic (exploração da fluidez de género com um toque estético específico), também surgiram como respostas culturais às normas dominantes — muitas vezes com um espírito de resistência, outras apenas como forma de expressão pessoal.
O lado sombrio: da estética à manipulação
Apesar da riqueza destas subculturas, existe um risco real de apropriação por grupos com agendas ideológicas, como certos sectores da extrema-direita online. Estes grupos utilizam a estética alternativa e o discurso “anti-sistema” para infiltrar mensagens políticas mais radicais, disfarçadas de rebeldia ou ironia. Embora não representem a maioria das comunidades, é importante estar atento a esta dinâmica e promover uma participação crítica e consciente nos espaços digitais.
A importância da expressão cultural
No seu melhor, estas subculturas digitais funcionam como espaços de liberdade criativa, pertença e construção identitária. Permitem que jovens experimentem estilos, ideias e formas de viver que não encontram lugar na cultura dominante. E, com a visibilidade que as redes sociais oferecem, estas vozes tornam-se cada vez mais presentes no tecido cultural contemporâneo.
Conclusão
As subculturas urbanas não desapareceram — apenas mudaram de morada. Hoje vivem nos ecrãs dos nossos dispositivos, moldadas por algoritmos, hashtags e comunidades virtuais. Cabe-nos, enquanto observadores e participantes, valorizar a sua diversidade, reconhecer o seu potencial criativo e manter um olhar atento às forças que, por vezes, procuram desvirtuá-las.
A cultura digital deu voz a muitas formas de expressão marginalizadas. Mas essa liberdade vem com riscos. Num ecossistema onde algoritmos, anonimato e estética se cruzam, é essencial desenvolver uma literacia crítica que permita distinguir entre criação cultural e instrumentalização ideológica.
Bibliografia
- Hebdige, Dick (1982). Subcultura: o significado do estilo. Lisboa: Edições 70.
(Tradução portuguesa do clássico que introduz o conceito de subcultura nos estudos culturais.) - Lemos, André (2013). Cibercultura. São Paulo: Editora Sulina.
(Fundamental para entender o impacto das tecnologias digitais na cultura contemporânea.) - Martins, Moisés de Lemos (2002). Para uma inversão do olhar: o estudo das culturas na sociedade contemporânea. Braga: CECS / Universidade do Minho.
(Obra relevante para o enquadramento teórico dos estudos culturais em Portugal.) - Ferreira, Cláudia (2020). A estética como espaço político nas redes sociais. In Revista Estudos de Comunicação, n.º 48.
(Reflexão sobre a estetização da política nas plataformas digitais.) - Maly, Ico (2019). New Right Metapolitics and the Algorithmic Activism of Schild & Pepe the Frog. Social Media + Society, 5(2).
(Apesar de estar em inglês, é útil para compreender como grupos extremistas actuam nas redes sociais.) - Silva, Armando Malheiro da & Martins, Bruno (2016). Cibercultura, redes e práticas comunicacionais. Porto: UFP Press.
(Obra portuguesa que articula cibercultura, media e práticas sociais no digital.)
(1) imagem disponível em: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:My_subculture_-_your_subculture_%28201669937%29.jpg acesso em 19 de Maio, 2025 – Ironical t-shirt seen at the fuckparade in Berlin.
(2) imagem disponível em: https://tsl.news/opinion-dark-academia-an-alternative-take-on-education-and-privilege/ acesso em 19 de Maio, 2025 – The dark academia genre can help dismantle the elitism of the classics, argues Yifei Cheng PO ‘24.
interessante texto sobre as subculturas “digitais”